A REPRESENTAÇÃO DA MULHER EM “DOM CASMURRO” DE MACHADO DE ASSIS
A Literatura como fonte para a História é um objeto de estudo relativamente, recente, pois surge com o advento de uma Nova História Cultural, a partir de uma quebra, do que Chartier vai chamar de “paradigmas dominantes” (1991, p. 173), existentes na História até então. Os Annales terão grande importância nesse processo de reformulação da História. Com a História Cultural abrem-se novos horizontes, novas possibilidades, para o estudo e pesquisa da História. Desta maneira a História se renova, sem abandonar o rigor do seu método de pesquisa e é por isso que a Literatura, assim como o cinema e outras produções mais populares, podem ser exploradas como fontes.
Para utilizar a Literatura como fonte é necessário entender as semelhanças e diferenças entre a História e a Literatura. Ambas, História e Literatura, são narrativas, a História é uma narrativa sobre o passado, o que irá liga-la aos conceitos de representação e imaginário, ligando-a mais uma vez a Literatura, por isso ambas tem o real como ponto de partida: “para negá-lo, ultrapassá-lo ou transfigurá-lo” (PESAVENTO, 2003, p. 33). O imaginário, a que Pesavento se refere, é a maneira pela qual os homens constroem a sua visão de mundo. Esta diferença é a que a história explora os fatos baseando-se numa realidade, enquanto que a preocupação da Literatura é construir uma narrativa coerente, dito isto ambas partem de um imaginário, já que o historiador preenche as lacunas com o seu imaginário, enquanto que o mundo literário vem da mente do escritor e ele pode moldá-lo da maneira que desejar.
O historiador irá basear-se em fontes e em fatos que aconteceram, mas ao traçar trajetórias acerca destes fatos ele terá que fazer uma investigação e escrever um caminho que, de certa forma, será ficcional, pois a História não pode ser comprovada e nem verificada, ela é escrita através de investigações, com a construção de uma trajetória, considerada a mais provável devido às pesquisas realizadas. Essa trajetória estará encharcada de ficção, pois o historiador fara conjecturas prováveis, mas não é uma ficção, pois parte de documentos e fontes e principalmente de um evento que aconteceu.
Entender o contexto histórico da fonte literária é fundamental para que se entenda o conteúdo de uma obra. O pensamento e a linguagem comuns à um tempo devem ser problematizados pelo historiador. Assim como que a Literatura só vai ser útil para pesquisar a época em que foi escrita. Ainda, importante ressaltar, que a Literatura, usada como fonte, tem algumas limitações, ela vai ser útil quando o objetivo envolve compreender os sentimentos, os valores e para entender como o ser humano era representado e como o mundo era representado.
Com estas novas possibilidades para pesquisa, os objetivos da História mudam. Se antes se tinha como princípio fazer um História Global o que se pretende agora trata-se de explorar “uma pluralidade de abordagens e compreensões” (CHARTIER, 1991, p. 176). A História passa a preocupar-se com as particularidades e a entrar nas sociedades através de um fato histórico, é aí que Chartier introduz o tema das representações, considerando que não há nenhuma estrutura que não seja formada pelas representações.
Através do texto encontram-se as representações e é através dele que as representações são continuadas. Para entender como o texto atinge os leitores, seria importante entender a história do livro e dos efeitos e repercussões para que se compreendam as apropriações da História. Estas apropriações são realizadas por pequenos grupos, sendo fundamentais dentro de determinadas lógicas, dentro disso é importante atentar-se para as mudanças e os processos, a descontinuidade histórica, que afetam estes grupos.
Chartier utiliza o exemplo da literatura, o texto não deve ser entendido apenas como reconstrutor de relações sociais, é importante entender como esse texto era lido. É importante lembrar que o texto não existe em si mesmo, ele precisa de todo um suporte, que lhe vai permitir ser lido, e também depende da maneira que vai atingir o leitor. O autor se preocupa em escrever textos, estes textos serão transformados em objetos, estes objetos irão além daquilo que o autor imaginou, ao alcançar novos públicos e usos não imaginados.
As representações coletivas vão tentar romper com uma visão homogênea dos comportamentos sociais. As representações vão “comandar atos” (CHARTIER, 1991 p. 183), elas são diretamente responsáveis pela construção do mundo social e de comportamentos da sociedade. Com o retorno às representações coletivas tem-se a percepção de que a realidade é contraditória, e também de uma necessidade de afirmação de uma identidade social, por fim é a visão institucional que vai marcar ou o indivíduo ou o grupo social. Desta maneira as representações de poder sempre vão ter uma influência na construção das representações que o grupo tem de si, a partir de uma demonstração de união. A primeira é referente a uma visão imposta de fora para dentro e a segunda é uma visão construída de dentro para fora.
A representação, por um lado, faz uma ausência ser vista o que coloca uma diferença “entre o que representa e o que é representado” (CHARTIER, 1991, p. 184), e do outro é a apresentação de um indivíduo. As representações são feitas através de símbolos visíveis que vão ser postos no local do objeto de significância e passarão a ter o significado do objeto que representam. Para que esta relação seja possível de se entender é necessário que o signo também seja investigado para que não assuma um caráter aleatório como significado.
A literatura será questão importante no que concerne a representação, - isso pode ser lido também em Ricouer – como a crítica externa e interna do texto. Outra questão presente em Ricouer é a questão de que a representação é usada como signo, menciona também que o signo é entendido como homogêneo e, que o significante-significado migrou para várias regiões da linguagem. Aliás a linguagem e suas mudanças também serão importantes para entender a representação.
As representações existem a partir de imagens consideradas reais. E existem três tipos de discurso de representações: representação como cerne da prática social; como louvor ao poder; e o poder como representação, e a representação como poder. A representação como poder representa uma ausência (no ato de representar algo/alguém que detém o poder), e uma presença (o detentor do poder se faz presente através de algo/alguém legitimando-o).
Ao falar sobre representação irá desenvolver o conceito de representância que reúne todos os conceitos citados por Ricoeur. É através dela também que se faz uma relação com memória e representação. Por fim diz: “as coisas do passado são abolidas, mas ninguém pode fazer com que não tenham sido.” (RICOEUR, 2007, p. 294). Para ele esta é a condição histórica do passado, já foi, não é mais, mas continua sendo através das representações.
Dentro das novas perspectivas para a História entra, também, a História das Mulheres. É a partir da abertura dessas novas possibilidades que pode-se pesquisar uma História feita por mulheres e para mulheres. Scott dirá: “é ao mesmo tempo um suplemento inócuo a história estabelecida e um deslocamento radical dessa história.” (SCOTT, 1992, p. 35) Isso quer dizer que a História é algo, mesmo semelhante a História, complemente diferente à ela.
A História das Mulheres surge a partir dos Movimentos Feministas, na década de 60, principalmente nos Estados Unidos. Surge muito ligada à questão política, tanto que Joan Scott utiliza o termo movimento para diferenciar o que nasce como História das Mulheres, neste período, que estava muito ligada a política. Na década de 80 a História das Mulheres começou a desligar-se da política e adquirir um campo de pesquisa próprio e mais consolidado, já que gênero é um termo neutro e sem caráter ideológico.
Muitos assuntos, antes da História Cultural, eram vistos como desnecessários, por isso não eram estudados. Um destes assuntos é a história das mulheres. É bem verdade que, recentemente, as mulheres vêm ganhando cada vez mais espaço na historiografia, mas ainda há muito para se estudar, há muito tempo de negligência para ser superado.
Durante um longo tempo a história foi feita pelos homens e para os homens, as mulheres não eram consideradas como agentes da história e, muitas vezes, nem como leitoras dela. Por isso olhar e tentar lançar um pouco de luz sobre como era o cotidiano e o comportamento das mulheres é tão importante. Principalmente porque os trabalhos de pesquisa sobre as mulheres começaram a ganhar notoriedade no fim do século XX, sendo um movimento recente, é de demasiada importância que as mulheres possam se enxergar nas linhas da história, como agentes da mesma.
A História das Mulheres é uma maneira de investigar o passado e olhar para o que foi dito como “verdadeiro”, procurando novas perspectivas. A “História do Homem” teve um destaque muito maior do que o dado para a História das Mulheres. Com a História das Mulheres se propões que estude a “cultura das mulheres”, não se abre a perspectiva de uma História das Mulheres para que sejam tratadas como vítimas de uma História não contada. O objetivo é, que agora, esta História seja contada e investigada, para que possamos conhecer este outro lado – dos muitos – da História, o lado das mulheres.
A Mulher em “Dom Casmurro”
Tenho como proposta entender de que maneira a mulher era representada na obra de Dom Casmurro de Machado de Assis. Diante disso tenho como base a literatura como crítica social feita por Machado, para entender qual eram as imagens, ou imagem, de mulher em fins do século XIX, período em que o livro é escrito.
Ao se dispor a estudar a história tendo como fonte uma obra literária, tenho em mente as diferenças entre as narrativas histórica e literária. A literatura retrata alguns aspectos da sociedade, mas ela não pode ser interpretada como real de fato, a literatura é uma ficção, sem qualquer compromisso com a realidade, e que tem o privilégio de fundar-se numa realidade, num tempo e com características destes. Enquanto que a história tem um compromisso com o método de pesquisa específico da história, deve ser lida com a ajuda da imaginação mas, jamais como ficção.
Tendo isso como parâmetro, busco construir esta breve pesquisa sobre a busca por se fazer uma história das mulheres e entender de que maneira elas eram compreendidas pela sociedade. Não me atenho a um fato específico para tratar deste assunto, mas sim ao modo como as mulheres foram escritas por Machado, que me é particularmente interessante.
A literatura vai retratar fatos subconscientes que as sociedades não demonstram claramente ou, que não querem demonstram. Ela é uma maneira de interpretar a sociedade de seu tempo, turva, mas ainda assim legítima. Para que a literatura seja utilizada como fonte é necessário que se faça um mapeamento do contexto histórico e de quem era o autor, com isso será possível delimitar quais intenções do autor ao produzir a obra. Como diz Piza “Machado, como todo grande criador, foi ao mesmo tempo expressão de sua época e exceção a ela”. (2008, p. 11).
Ao escolher Machado de Assis tenho em mente que este autor, principalmente nesta sua segunda fase – chamada realista, apesar de o próprio Machado não se achar um realista, é a definição que utilizaremos - preocupa-se em fazer uma crítica social. Pois Machado conviveu constantemente com o preconceito social por ser pobre; racial, por ser mulato; intelectual, por ter sua escrita considerada simplória. Foi isso que contribuiu para que escrevesse as suas obras com uma crítica social, que, ao mesmo tempo é latente e discreta.
Hoje existe a alternativa de utilizar a literatura como fonte graças à história cultural. Com a História Cultural a literatura tornou-se muito próxima da história. Podemos colocar aí o papel que ambas tem de narrar fatos, a literatura pode ter como meta a ficção, ou não, enquanto que a história precisa que a sua narrativa tenha ocorrido, para que possa ser considerada história. A preocupação de que a literatura poderia fazer com que a história se tornasse ficção deve ser levado a sério.
Para tentar entender como a mulher era representada é necessário entender também como funcionavam as estruturas de poder, regulando o pensamento e o comportamento das pessoas. Para isso utilizo um trecho de Chartier:
“As representações do mundo social assim construídas, embora aspirem à universalidade de um diagnóstico fundado na razão, são sempre determinadas pelos interesses de grupo que as forjam. (...) As percepções do social não são de forma alguma discursos neutros: produzem estratégias e práticas (sociais, escolares, políticas) que tendem a impor uma autoridade à custa de outros, por elas menosprezados, a legitimar um projeto reformador ou a justificar, para os próprios indivíduos, as suas escolhas e condutas. (...) As lutas de representações têm tanta importância como as lutas econômicas para compreender os mecanismos pelos quais um grupo impõe, ou tenta impor a sua concepção do mundo social, os valores que são seus, e o seu domínio.” (CHARTIER, p. 17, apud PACHECO, 2005 p, 3).
Desta maneira as representações tem importância histórica ao analisarmos as características de uma sociedade, são modelos forjados pelos grupos dominantes, o discurso literário não é um discurso neutro, por isso para entendermos uma representação é necessário que entendamos os meios que a forjaram. Como bem sabemos o viver em sociedade e os costumes reverberam pelas pessoas, assim como as representações, sejam elas críticas ou não, estão fundadas nesse modelo que é o objetivo da sociedade ou num que se propõe ser a sua sátira, a nós resta saber discerni-los.
Para tanto é preciso entender o autor, conhecer a sua vida e as suas motivações. Machado de Assis é um autor que faz críticas em um tom ácido, revestidas com um pouco de humor e outro pouco de insanidade. Diante disto o livro Dom Casmurro é narrado por Bentinho, no ato da transcrição de suas memórias. Conta a História dele e de Capitu e a suposta traição desta com Escobar, que era muito amigo de Bentinho. Neste aspecto as descrições serão sempre turvas e muitas vezes ambíguas, já que Bentinho é o narrador, o ofendido e único ao qual pode ser extraída uma versão para história, em alguns momentos Bentinho demonstra uma insanidade, como neste momento da narrativa: “catei os próprios vermes dos livros, para que me dissessem o que havia nos textos roídos por eles” (ASSIS, 2004, p. 33).
Em Dom Casmurro diferentes mulheres têm diferentes personalidades, podemos notar a devoção que a mãe de Bentinho nutria pela família e pelo seu marido, mesmo após a morte deste: “Minha mãe era uma boa criatura. Quando lhe morreu o marido, Pedro de Albuquerque Santiago, contava trinta e um anos de idade, e podia voltar para Itaguaí. Não quis; preferiu ficar perto da igreja em que meu pai fora sepultado” (ASSIS, 2004, p. 18).
Referindo-se a Capitu: “A gente Pádua não é de todo má. Capitu, apesar daqueles olhos que o diabo lhe deu... Você já reparou nos olhos dela? São assim de cigana oblíqua e dissimulada. Pois, apesar deles, poderia passar, se não fosse a vaidade e a adulação.”(ASSIS, 2004 p, 44). Este trecho é uma fala do agregado Pádua.
Os olhos de Capitu são uma das suas principais características na proposta de rotulá-la como uma mulher sedutora com o “cigana oblíqua e dissimulada” (ASSIS, 2004 p. 57), muitas vezes utilizado como uma contraposição entre a Capitu menina, a da infância, e a Capitu adulta.
Estas representações podem ser caracterizadas pela constituição de família burguesa que se formava no século XIX. Numa família patriarcal a mulher deveria se dedicar, exclusivamente, ao marido e aos filhos. A descrição de Capitu, pode ter como justificativa, o fato de ser realizada ao fim da vida de Bentinho, depois deste já ter construído todo o cenário de sua suposta traição.
Era comum que existisse um padrão duplo de moralidade, as mulheres boas, para casar, eram aquelas da mesma classe social, de família, bem educadas e, principalmente, puras. As mesmas regras não valiam para os homens. Bem como o casamento religioso era como que obrigatório, mas quando pesquisamos um pouco mais percebemos que os concubinatos eram muito comuns, assim também como as uniões informais.
Os limites da estratificação social eram mais definidos nas camadas sociais mais altas, enquanto que nas camadas mais pobres as pessoas tinham mais liberdade, sendo que as constituições familiares eram mais complexas. A defesa da família estava muito ligada a preservação da honra, pela qual o chefe da família (homem: pai, irmão, avô) deveria zelar. No período da Belle Époque o homem continuou sendo a cabeça da família, sendo que surgiram muitas propagandas, do governo e em revistas femininas, incentivando as mulheres a cuidarem da casa, do marido e dos filhos e, a não trabalharem, tornando-as extremamente dependentes.
O poder, de fabricar uma opinião sobre o livro está todo nas mãos do narrador, Bentinho, e é através dele que permanecem as dúvidas sobre a honestidade de Capitu, mas essa não é a questão. A questão é, como o texto retrata uma mulher cheia de artimanhas e sedutora como a mulher a imperfeita e, a mulher perfeita como a mãe bondosa e obediente. Desta maneiras representações estarão ligadas a estruturas de poder e, esta estrutura em que os homens são dominantes, vai impor as mulheres um lugar de docilidade.
Referências
Milena Calikoski, acadêmica do 3° ano de História UNESPAR.
ASSIS, Machado de. Dom Casmurro. Barcelona. Espanha: Gold Editora Ltda. 2004.
BORGES, Valdeci Rezende. História e Literatura: Algumas Considerações. Revista de Teoria da História. Ano 1, Número 3, junho/2010.
CHARTIER. Roger. O Mundo como Representação. In: Estudos Avançados 11, (5), 1991.
D’INCAO, Maria Ângela. Mulher e Família Burguesa. In: PRIORE, Mary (org.) História das Mulheres no Brasil. S.P: Contexto, 1997.
PACHECO, Alexandre. As Implicações do Conceito de Representação em Roger Chartier com as Noções de Habitus e Campo em Pierre Bordieu. ANPUH – XXIII Simpósio Nacional de História, Londrina, 2005.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. O Mundo como Texto: Leituras da História e da Literatura. História da Educação, ASPHE/FaE/ EFPel, Pelotas, n. 14 p. 31 – 45, set. 2003.
PIZA, Daniel. Machado de Assis um Gênio Brasileiro. 3° ed. São Paulo. Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2008.
RICOEUR, Paul. A Representação Historiadora. In: A Memória, a História, o Esquecimento. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2007.
SCOTT, Joan. História das Mulheres. In: BURKE, Peter (org.). A Escrita da História: Novas Perspectivas. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1992.
Belíssimo texto. A literatura pode ser um meio eficaz para o entendimento das relações humanas. Partindo dessa premissa, o livro Dom Casmurro com sua ponderação sobre o comportamento feminino poderia basear um estudo sobre a história da mulher no ramo do Direito? Auxiliando assim no entendimento das mudanças no que consiste ao tratamento entre homem e mulher, modos de se vestir, de falar e outros. O livro Clara dos Anjos também pode ser usado para se fundamentar essas relações femininas, no que consiste a ilusão e talvez até ao estupro?
ResponderExcluirObrigada pela pergunta. Acredito que Dom Casmurro não seja a melhor obra para basear uma pesquisa sobre a história da mulher no direito. Não trato disso na minha pesquisa, por isso não posso responder com propriedade. Com relação a Clara dos Anjos, pode sim ser feito um paralelo com a legislação da época, para que se entenda de que maneira as mulheres eram amparadas, pela lei, e como esse amparo funcionava, mediante as questões que você propôs.
ExcluirParabéns pelo artigo. O encontro entre historia, litertura e genero pode ser realmente muito promissor. Claro que o limite de espaço nos impede de aprofundar mais ainda sobre o objeto de pesquisa, pensando nisso faço aqui algumas reflexões pra você. Dom Casmurro é o ponto de vista masculino sobre o fim de um casamento. O narrador vai enumerando uma sequencia de elementos para atribuir a culpa sobre Capitu e torna-la a grande vilã do enredo. Vc já pensou em aprofundar a pesquisa sobre o valor social do casamento a partir da literatura machadiana? Acho que seria interessante também pegar outros romances e tentar enxergar a visão de machado em relação as mulheres. Sugestão de leitura caso vc queira continuar: Luis Felipe Ribeiro. Mulheres de papel.Um estudo do imaginario em J Alencar e M de Assis.
ResponderExcluirMara Lígia Fernandes Costa
Obrigada pela sugestão. A minha proposta é sobre a mulher e o seu comportamento relacionado a família, o padrão e o que foge deste padrão. Para isso pretendo sim utilizar outras obras de Machado de Assis. O casamento não é o meu principal foco para análise, mas é um caminho que pode ser pensado sim.
ExcluirPrezada Milena,
ResponderExcluirParabenizo-a pelo texto. Como professora de literatura e doutoranda em um curso interdisciplinar, vejo esse diálogo entre história e literatura como essencial para a formação humana. A partir da reflexão sobre as representações sociais e a forma como elas são estruturadas ficcionalmente, o/a estudante poderá desenvolver uma consciência crítica acerca de seu mundo, percebendo que todo e qualquer discurso é proferido a partir de um lugar de fala específico, que envolve relações de poder. O teu referencial teórico é pertinente e sustenta muito bem teu posicionamento sobre o tema.
Gostaria de fazer alguns apontamentos a respeito de teu texto, a fim de estimular o debate acerca da utilização de fontes literárias nas aulas de História. Em determinado momento, você afirma “Assim como que a Literatura só vai ser útil para pesquisar a época em que foi escrita.”. Acredito que a frase é demasiado categórica e contrasta com as afirmações que você faz em seguida (talvez tenha sido somente um desvio na escrita). Se a literatura servir unicamente para pesquisa da época, ela será esvaziada de sua natureza afetiva, ou seja, da possibilidade de provocar diferentes recepções, interpretações e pontos de vista. Sem a abordagem das representações das personagens e das motivações subjacentes às ações, a literatura será uma fonte tão burocrática quanto um testamento ou um livro de atas.
Em outra passagem, você registra “Machado de Assis é um autor que faz críticas em um tom ácido, revestidas com um pouco de humor e outro pouco de insanidade.”. A insanidade que se pode constatar em “Dom Casmurro” pertence ao narrador e não ao autor, Machado de Assis. Há, aqui, uma confusão de conceitos fundamentais do campo literário, a qual, transposta à sala de aula, pode causar distorções na interpretação do romance.
Gostaria de frisar que compreendo que cada curso possui sua especificidade e que o graduado em História não possui a formação condizente à teoria literária (da mesma forma, o graduado em Letras, quando muito, possui uma formação embrionária no campo histórico). Dessa maneira, gostaria de saber sua opinião sobre a questão: de que maneira utilizar fontes literárias na aula de História, respeitando a especificidade artística do texto literário?
Atenciosamente,
Tatiane Kaspari.
Meus parabéns pelo excelente texto. Admiro muito você por trabalhar a literatura enquanto fonte.
ResponderExcluirGostaria de saber como abordar na sala de aula a questão de gênero através da literatura, com o intuito de fazer uma desconstrução ao pensamento machista, uma vez que a mulher retratada no livro, Capitu, é descrita pelo olhar de um homem, o que corresponde por muitas vezes o olhar de uma sociedade perante uma mulher.
Obrigada!
Flávia Schena Rotta
Excelente texto! Dom Casmurro é um livro muito marcante para mim.
ResponderExcluirDom Casmurro foi um livro pela primeira vez publicado em 1899, boa parte das criticas feitas a Capitu pelas personagens, é pelo fato de ser uma mulher que toma atitudes e fala o que pensa em um mundo extremamente machista. O movimento feminista moderno nasceu por volta de 1960, podemos então relacionar as atitudes de Capitu, pela visão do narrador, de certa forma feminista para sua época?
Nicolle Evans Sousa Nunes
Obrigada pela pergunta. Capitu é o que podemos chamar de uma mulher que foge ao padrão do que era ser considerada, uma boa mão e uma boa esposa. Não creio que feminista é a melhor palavra para referir-se a Machado de Assis, é verdade que fazia uma crítica social, mas ela não era meramente restrita ao comportamento feminino. Machado vai ser uma expressão de sua época.
ExcluirExcelente texto! gostaria de saber quais outras obras de Machado de Assis você analisou, e qual seria a melhor maneira de trabalhar o tema em sala de aula.
ResponderExcluirFranciele Marcos Velho
Este comentário foi removido pelo autor.
ExcluirObrigada pela sua pergunta. Para este trabalho eu analisei Dom Casmurro, apenas. Mas, para trabalhar o tema de maneira mais abrangente, vou trabalhar com os contos de Machado de Assis. Quanto a maneira de trabalhar em sala de aula, eu não posso te dar uma resposta tão aprofundada, por que nunca faz parte da minha experiência, mas acredito que sempre trabalhando com trechos em forma de oficinas.
Excluirótima análise. A conclusão me fez refletir: mesmo com as demonstrações de insanidade de Bentinho e a perspectiva unilateral dos acontecimentos apresentados no livro, mais de um século após o lançamento do livro, a reflexão primordial que atinge os leitores de Dom Casmurro ainda é a questão da fidelidade de Capitu. Não seria essa uma característica da permanência dessa estrutura de poder na sociedade atual?
ResponderExcluirAna Carolina Vilas Boas
Obrigada pela sua pergunta. O livro foi escrito com a intenção de que nos questionemos sobre quem realmente conta a verdade. O fato é que não dá pra saber, por isso Dom Casmurro é tão intrigante. A permanência dessa estrutura de poder patriarcal pode ser notada em vários âmbitos da sociedade. O questionamento sobre a traição ou não de Capitu, tem mais a ver com a intenção da obra em si, que era é o de fazer com que o leitor se questione. O fato de que é a moralidade da mulher - a pergunta é sempre 'Capitu traiu ou não traiu?' - que esteja em dúvida é sim um fato que pode ser relacionado a manutenção desse poder.
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